Berlinda Band na segunda apresentação pública, no Hangar. By Suely Nascimento. |
O encontro de
escritores paraenses realizado na sexta-feira, dia 06/06, do qual eu participei
juntamente com os jornalistas Walter Pinto, autor do livro “1932 – A revolução
constitucionalista no Baixo Amazonas”, e Ruth Rendeiro, que escreveu “Até que o
câncer nos separe” foi um momento na viagem do meu romance “Berlinda – asas para
o fim do mundo” que teve uma dose especial. Pela segunda vez a música da trilha
sonora esteve presente com o conjunto que nasceu nesse encontro da ficção com o
real. E agora parece que a turma da música deu mais um passo para oxigenar a Berlinda
Band, que na formação original tinha o Hélio Silva, no violão, mestre Ginja, no
Djambe, Gabriel Gomes, na percussão, Marinho Gtr, no violão e a voz de Reginaldo Viana. Ontem, a Berlinda Band contou com o auxílio
luxuoso do compositor e cantor Firmo Cardoso, um dos meus parceiros na trilha
musical do romance, que está a caminho, no CD que será lançado em breve. O
outro toque especial ficou sob a responsa do Kassio, no acordeon.
Além da banda
foi exibido o clipe do samba-enredo “Derruba o muro, mistura tudo e que Deus
nos Acuda”, dirigido pela jornalista Adelaide Oliveira e com edição de Savio
Palheta.
O tempo definido
para o evento foi curto. A banda teve
que cortar duas músicas do pocket show que havia ensaiado e deixou um gosto de
quero mais. Mas vai ter bis assim que o CD chegar a Belém.
O romance “Berlinda”
me abriu caminho para mostrar a fusão da literatura com outras expressões
artísticas. Lembro-me de que quando escrevia o livro, a imaginação do escritor
me jogou também para outro mundo paralelo. Lá, comecei a escrever letras para
alguns personagens e que já traziam consigo a intenção de serem musicadas.
Acredito que seja um trabalho inédito até que se prove o contrário. Pelo menos
por essas bandas amazônicas não conheço uma experiência semelhante. Penso que “Berlinda”
é o primeiro romance com trilha musical independente.
Quando
apresentei o romance e a música em Berlim ficou mais claro na minha cabeça que
a experiência solitária do escritor poderia ser repensada no que fazer depois
do livro escrito. O livro, quando ganha o mundo, por mais que passeie de mão em
mão não descontrói a experiência do isolamento e da solidão vividas pelo
leitor. O livro vai para a mão de anônimos, não há qualquer interação entre
escritor e leitor para festejar o fim da clausura.
Se o livro ganha
uma versão para o cinema, por exemplo, a história é terceirizada, sem a
interferência do autor, em alguns casos. Acontecerá o mesmo se o romance ganhar
uma adaptação teatral e até mesmo de balé, a ausência do autor no processo
criativo.
Quando conclui “Berlinda”
e parti para a criação de uma trilha para os personagens, fiz uma interferência
direta. Quebrei o isolamento em que vivi
enquanto escrevia e tornei a história do romance num projeto coletivo. Chamei
parceiros e criei uma ponte e um chão para o livro ser ouvido, pois estava
carregado de musicalidade e queria sair do pedestal onde a literatura fica ou a
colocam. A música é popular, a literatura não é massificada. Dei um livro para
cada um parceiros e nos encontros realizados no estúdio de gravação, sempre
tínhamos um tempo para que falasse do romance e da ideia sobre a trilha. Foi um
bom trabalho de imersão. Todos assumiram o projeto com muita garra e disposição
de dar o melhor de si.
A criação do vídeo
com o samba-enredo do último capítulo do livro deu uma mostra da visualidade de
literatura e também virou processo coletivo.
O surgimento da Berlinda
Band foi um momento especial e marcante que tornou o livro mais presente nessa
semente que plantei com algumas dificuldades no tempo de semear, mas que nem
cabe aqui enumerar.
Quem produz
cultura no Brasil, e é a maioria, não um grupo privilegiado por ausência de uma
política cultural que seja para todos, sabe muito bem que meter a mão na massa
e suar a camisa é a realidade. Além de ser um esforço operário é preciso ter
vocação franciscana para concluir projetos que nascem de sonhos, ideias e
ideais. Não é necessário fazer voto de pobreza, mas ter consciência de que o
caminho das pedras pode ser longo e doloroso. Mas quem o escolheu que vá em
frente ou entre no próximo desvio. Quem vive na Amazônia deve ter em mente que
não somos um polo cultural na pátria amada salve salve! E minha experiência
como leitor, principalmente, diz que santo de casa não faz milagre. Assim como
os muros existentes ou já demolidos, como o de Berlim, temos outros muros,
alguns sutis, outros no limbo da memória, outros como elementos do cenário e
talvez mais naturais, como silêncio das selvas e um caminho arbóreo para
ultrapassar. Ainda persiste uma ideia de que aqui só tem mata e que nossas ruas
sofrem congestionamento provocado por jacarés.
Chega a ser risível, mas a Amazônia ainda não foi descoberta e sua produção cultural menos ainda. Nesses muros erguidos ao longo dos séculos, esquecem que além do meio ambiente há territórios habitados e que o povo daqui faz parte da história local, produz sua própria história e que não pode mais ser excluído, faça tempo bom para alguns ou tempo ruim para todos. E isso não é ficção.
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